Òrìsà Oyà / Inhançã / Iansã

 

Arquetipicamente, é a mulher guerreira que, em vez de ficar no lar, vai à guerra. São assim os filhos de Oyà, que preferem as batalhas grandes e dramáticas ao cotidiano repetitivo.
Costumam ver guerra em tudo, sendo portanto competitivos, agressivos e dados a ataques de cólera. Ao contrário, porém, da busca de certa estratégia militar, que faz parte da maneira de ser dos filhos de Ògún, que enfrentam a guerra do dia a dia, os filhos de Oyà costumam ser mais individualistas, achando que com a cora-gem e a disposição para a batalha vencerão todos os problemas, sendo menos sistemáticos, portanto, que os filhos de Ògún.
São quase que invariavelmente de Oyà os personagens que transformam a vida num buscar desenfreado tanto do prazer como dos riscos. São fortemente influenciados pelo arquétipo da deusa aquelas figuras que repentinamente mudam todo o rumo de sua vida por um amor ou por um ideal. Faz parte dos filhos de Oyà a maior parte dos militantes políticos não cerebrais por excelência, que escolhem uma facção por paixão mais do que por reflexão e dificilmente se afastarão das determinações coletivas do que deve ou não ser feito, que idéias merecem defesa etc. ao mesmo tempo, quando rompem com uma ideologia e abraça outra vão, mergulhar de cabeça no novo território, repudiando a experiência anterior de forma dramática e exagerada, mal reconhecendo em si mesmos as pessoas que lutavam por idéias tão diferentes e que hoje passam a ser considerados repugnantes. Talvez uma súbita conversão religiosa, fazendo com que a pessoa mude comple-tamente de código de valores morais e até de eixo base de sua vida, pode acontecer com os filhos da deusa num dado momento de sua vida. Essa adesão ao oposto do que era vivido não é superficial, ficando for-temente arraigada no novo código de comportamento da pessoa.
Essa mudança foi fascinantemente sincera e honesta. Isso, porém, não quer garantir fidelidade até o fim da vida: da mesma forma que o filho de Oyà revirou sua vida uma vez de pernas para o ar, poderá novamente chegar à conclusão de que está enganado e, algum tempo depois, fazer mais uma alteração tão ou mais radical ainda que a anterior.
O temperamento dos que têm Oyà como Òrìsàs de cabeça costuma ser instável, exagerado, dramático em questões que para outras pessoas, não mereceriam tanta atenção e principalmente, tão grande dispêndio de energia. Eles fazem mesmo tempestades em copo d’água e perdem amizades de vidas inteiras por não avaliarem corretamente as acusações que são capazes de fazer num momento de explosão, pois para eles aquele momento é de guerra; a pessoas que está à sua frente é o inimigo e só uma palavra de ordem serve para eles: aniquilar, destruir. Podem ser particularmente mesquinhos em suas vinganças, exagerando o número de atitudes que tomam se comparado com o primeiro móvel de sua vingança.
São do tipo Oyà aquelas pessoas que podem ter um desastroso ataque de cólera no meio de uma festa, num acontecimento social, na casa de um amigo e, o que é mais desconcertante, momentos após extravasar uma irreprimível felicidade, fazer questão de mostrar, a todos, aspectos particulares de sua vida. É verdade que certo exibicionismo pode fazer parte do seu arquétipo, mas os filhos de Oyà não desejam apenas atrair a atenção dos outros quando socializam suas emoções. Mais do que isso querem efetivamente dividir a grande alegria, expor o grande prazer para ele poder ser compartilhado, querem que todos estejam imbuídos dos mesmos sentimentos que vivem naquele momento, pois tais emoções parecem tão fortes que, para um filho de Oyà, elas devem ser capazes de contagiar a todos.
Como este é arquétipo que gera muitos fatos, é comum que pessoas de Oyà surjam freqüentemente nos noticiários. Se para elas cada ato é dimensionado numa visão grandiosa, cada gesto deve ser conseqüências arrasadoras ou empolgantes; não é difícil perceber-se que são geradoras natas de noticias.
Ao mesmo tempo, é um caráter cheio de variações, de atitudes súbitas e imprevisíveis que costumam fascinar senão aterrorizar os que os cercam e os grandes interessados no comportamento humano. Essa é uma razões que levam os ficcionistas a mostrar tipos de Oyà em seus personagens, pois passam a ter nas mãos figuras que conduzem as histórias com muita liberdade, conduzindo as tramas para caminhos insuspeitados, abrindo um leque de opções para quem trabalha com a imaginação. São, como se diz, prato cheio para quem lida com o comportamento humano e para quem narra histórias sobre esse comportamento. A Gabriela de Jorge Amado, por exemplo, se encaixa bem nesse tipo, pois, quando deseja, tira os sapatos, joga-os para o ar e sai brincando com as crianças na rua, feliz porque o sol bate em sua pele, porque é gostoso brincar de roda, esquecendo os horários e as obrigações, porque naquele dado momento de sua vida encontrou uma fonte de prazer deliciosa, que talvez não exerça o mesmo encanto amanhã.
Os filhos de Oyà são atirados, extrovertidos e chocantemente diretos. Às vezes tentam ser maquiavélicos ou sutis, mas só o conseguem com os que não os conhecem detidamente. Ou se conseguem, será apenas por pouco tempo, pois uma contrariedade, uma vontade não satisfeita, um incidente menor pode fazer o caldo entornar e a pessoa ter uma espécie de acesso de fúria, despejando tudo o que mantinha escondido, transformando sua tentativa em ser surpreendente num mero segredo de polichinelo. Em longo prazo, um filho de Oyà sempre acaba mostrando cabalmente quais seus objetivos e pretensões.
Eles têm uma tendência a desenvolver vida sexual muito irregular, pontilhada por súbitas paixões, que começam de repente e podem terminar mais inesperadamente ainda.
São muito ciumentos, possessivos, muitas vezes se mostrando incapazes de perdoar qualquer traição que não a que ele mesmo faz contra o ser amado, Oyà tende para o autoritarismo e sua mutabilidade faz com que o gênio de seus filhos seja muito difícil, mudando a cada momento, sem que os outros estejam preparados para essas guinadas.
Apesar de teoricamente prezarem a sinceridade, podem mostrar-se traiçoeiros com as pessoas que elegem como seus inimigos, inimigos esses que surgem às pencas, já que, perante a agressividade e a tendência à arrogância dos filhos de Oyà, não são poucos os que se rebelam.
Ao mesmo tempo, costumam ser amigos fiéis para os poucos escolhidos para seu circulo mais íntimo.
Profissionalmente, um filho de Oyà pode dar-se muito bem por causa de sua obstinação.
Se consegue descobrir seu verdadeiro talento, pode destacar-se, pois fará tudo o que é possível ,e um pouco mais, para ser conhecido dentro de sua carreira, querendo acima de tudo ser respeitado.um problema, porém, pode atrapalhar tudo: a inconstância com que vê sua vida amorosa; outros detalhes podem também contaminar os aspectos profissionais. Assim, não é de se espantar que um filho de Oyà não consiga fixar-se no mesmo trabalho e, por isso, não atinja nenhum tipo de sucesso.
Às vezes, mesmo na biografia de pessoas famosas de Oyà, percebe-se que antes de descobrirem suas verdadeiras habilidades, tentaram trabalhos os mais contraditórios e disparatados possíveis, que serviram para retardar seu crescimento dentro da carreira na qual se fixaram depois.
Todas essas características criam uma grande dificuldade de relacionamentos duradouros com os filhos de Oyà. Se, por um lado, são alegres e expansivos, por outro, podem ser muito violentos quando contrariados; se têm a tendência para a fraqueza e para o etilo direto, também não podem ser considerados confiáveis, pois fatos menores provocam reações enormes e, quando pessoas, não há ética que segure os filhos de Oyà, dispostos a destruir tudo com seu vento forte e arrasador

 

 

O QUE DIZ A LENDA

Oyà era amante de Sàngó, mas se cansou da rotina. Fugiu e foi para o vivendo reino de Ògún, com quem já tinha vivido e com quem mantinha um secreto relacionamento. Passou a viver com ele, mas Sàngó invadiu o reino em busca de sua amada. Oyà então pediu a Ògún que guerreasse por ela e a guerra foi feita. Mas Ògún exigiu que a amante fosse, para sua maior segurança, esconder-se no reino de Òsóòsi.
Lá foi Oyà e, com a convivência, acabou-se interessando por Òsóòsi, que cobiçara secretamente já há algum tempo. Sàngó, a essa altura, derrotou Ògún e não encontrou Oyà.
Soube da sua fuga e foi invadir o reino de Òsóòsi, pois só alcançaria a paz ao ter novamente Oyà ao lado. Òsóòsi, conclamado por Oyà, aceitou guerrear com ela mas,para sua maior segurança,lhe pediu para fugir para o reino de Obàlúwàyiè . O processo se repetiu mais uma vez. E assim sucessivamente Oyà teria escondido em cada reino, tido um caso com cada Òrìsà, sendo a grande amante dos iorubas. Ògún foi caçar na floresta e vendo um enorme búfalo, preparou-se para matá-lo, já que estava disposto a aproveitar a carne do fantástico animal. Surpreendentemente, porém a pele do búfalo se abriu e de dentro dele surgiu uma linda mulher: Oyà. Ela ricamente vestida, era uma figura sensual, cheia de ornamentos tipicamente femininos que a valorizavam ainda mais. A mulher dobrou toda a pele do búfalo e a escondeu num formigueiro. Feito isto, foi para o mercado como uma mulher comum, sem perceber que Ògún tinha presenciado tudo. Rapidamente ele se apoderou da pele escondida e a levou para sua própria casa. Indo ao mercado, seguiu Oyà, já completamente dominado pela obsessão de possuir aquela linda mulher. Fez propostas, que foram recusadas.
Oyà, porém, voltou para a floresta e descobriu que a pele tinha sumido. Sem saber o que fazer, voltou ao mercado e lá reencontrou Ògún à sua espera. Acusou-o do roubo. Exigiu tudo o que era seu de volta. Ògún se fez de tonto, não admitiu nada. Oyà, então,resolveu enfrentar situação: aceitava o pedido de casamento que Ògún lhe fizera, já que ele sabia ser ela um animal e não uma mulher. Mas impunha três condições: ninguém nunca poderia dizer-lhe diretamente que era um animal ninguém poderia usar cascas de dendê para fazer fogo; ninguém nunca poderia rodar um pilão pelo chão da casa. Ògún aceitou as condições e com ela se casou. Era como se, para viver uma vida de mortal, Oyà precisasse esquecer-se que fora animal. Tudo parecia correr bem. As outras mulheres de Ògún tinham ciúmes, mas não podiam fazer nada, já que Oyà continuava a ser a mais bela e a favorita do senhor da guerra. Mas, ousadamente, ao verem Oyà dar à luz o nono filho e ainda continuar como a preferida embriagou Ògún com vinho de palma, exigindo que ele lhe contasse o segredo que elas suspeitavam envolver Oyà. Ele revelou tudo e saiu para o trabalho. As mulheres, então, acusaram Oyà de ser um animal e até indicaram que sua pele estava escondida no celeiro. Oyà fingiu que não era com ela. Mas mal saíram as outras mulheres, foi correndo remexer o celeiro. Lá encontraram sua pele, seus cascos. Vestiu-os e eles se ajustaram perfeitamente. Ela recuperava toda a força do animal e não pôde controlar-se: atacou as outras mulheres de Ògún que a tinham feito sofrer e as aniquilou. Mas seus filhos clamavam por ela, que pretendia voltar a viver na floresta, Oyà, então, retirou seus chifres e os entregou a eles dizendo que sempre que dela necessitassem deviam toca-lo que ela surgira para defende-lo de qualquer ataque. É por isso que nos altares de Oyà sempre estão os chifres e esse é o costume ritual dos filhos da Òrìsà.