Òrìsà Òsún

 

O arquétipo psicológico associado a Òsun se aproxima muito da imagem que se tem de um rio, das águas que são seu elemento: a aparência da calma que pode esconder correntes, buracos no fundo, grutas tudo que não é nem reto nem direto, mas pouco claro em termos de forma, cheio de meandros. Os filhos d Òsun preferem contornar habilmente um obstáculo a enfrentá-lo diretamente ao contrário do que fariam os filhos de Oyà o Oba. Sua atitude novamente lembra o rio: quando a água encontra uma pedra muito grande que está em seu leito, em vez de chocar-se violentamente contra ela, Òsun aparentemente reconhece a superioridade da pedra: a água desvia-se. Mas se aparentemente admite a superioridade do outro elemento, a água na verdade está pacientemente fazendo um lento trabalho de erosão na pedra, destruindo-a quase que imperceptivelmente, agindo em longo prazo. Por isso mesmo, os filhos de Òsun são muito persistentes no que buscam, tendo objetivos fortemente delineados, chegando mesmo a ser incrivelmente teimosos e obstinados. Mas às vezes pode parecer que eles se esqueceram de uma questão anteriormente importante não se preocupando mais com ela e reforçando a imagem de superficialidade. Na realidade, porém, Òsun estará agindo por outros caminhos, usando outras estratégias. Para essa imagem doce, que esconde uma determinação forte e uma ambição bastante marcante colabora a tendência que os filhos de Òsun têm para engordar. Sua vaidade quase sempre os impede de se tornarem obesos, mas mantêm a imagem de seres roliços, sem ângulos fortes ou secos. A imagem do gordinho risonho e bem- humorado sem dúvida mantém parentesco com o arquétipo de Òsun, ainda mais que seus filhos gostam da vida social, das festas e dos prazeres em geral. Seu tom eternamente amigo e acessível acrescenta e reforça essa tendência. Mas, por trás de tudo isso, existe uma pessoa atenta e que não estará perdendo tempo, apesar de parecer desligada de tudo. O sexo é importante par os filhos de Òsun.
Eles tendem a ter uma vida sexual intensa e significativa, mas diferente da dos filhos de Oyà ou Ògún, enquanto estes revelam totalmente sua sensualidade, os filhos de Òsun são mais discretos, pois, assim como apreciam o destaque social, também temem os escândalos ou qualquer coisa que possa denegrir a imagem de inofensivos bondosos que constroem cautelosamente. Os casos, quando existem, são secretos e desprovidos de violência, já que Òsun gosta de relações gentis e suaves.
Ao mesmo tempo, o sexo é encarado como uma atividade gostosa que não precisa ser associada diretamente ao amor. Na verdade, os filhos de Òsun são narcisistas demais para gostarem muito de alguém que não eles próprios, mas sua facilidade para a doçura, sensualidade e carinho pode fazer com que pareçam os seres mais apaixonados e dedicados do mundo. Não costumam, conseqüentemente, descabelar-se por paixões impossíveis, são dando importância ao romantismo; são realistas, com os pés eternamente no chão.
Faz parte do tipo certa preguiça coquete, uma ironia persistente, porém discreta e na aparência, apenas inconseqüente. Verger define: O arquétipo de Òsun é o das mulheres graciosas e elegantes, com paixão pelas jóias, perfumes e vestimentas caras. Das mulheres que são símbolo do charme e da beleza. Voluptuosas e sensuais, porém mais reservadas que Oyà. Elas evitam chocar a opinião pública, à qual dão grande importância. Sob sua aparência graciosa e sedutora escondem uma vontade muito forte e um grande desejo de ascensão social. É, sem dúvida, uma imagem de rara sofisticação psicológica no universo violento, arrebatado e explicito dos òrisàs.
É a figura da juventude eterna com seu jeito de criança inconseqüente que julga naturalmente merecer todos os cuidados e mimos. Nos seus filhos, isso se revela no fato de o tempo passar mais lentamente por eles.
Mesmo quando fisicamente já dão sinais da idade, ainda existe dentro de um filho de um filho de Òsun um adolescente voluntarioso e jovial, que nunca desaparece, escondendo sempre, através da superfície serena do rio, as correntes misteriosas e imprevisíveis.
Quando não são bonitos fisicamente o que é raro, são no mínimo charmosos e misteriosamente sensuais. Seus olhos costumam ser muito vivos, a tendência da boca é parar num discreto e eterno sorriso. Têm consciência muito clara da imagem que possuem imagem essa que cultivam com grande vaidade e consciência. Adoram as roupas caras e vistosas e tudo que, no meio de uma sociedade de massa como a nossa, parece exclusivo ou não tão popularizado.
Devem tomar cuidado com a inclinação às doenças venéreas dadas sua inclinação à promiscuidade e ficar atentos com bebidas e drogas.
Como amam o prazer e a inconseqüência, é comum que seus filhos bebam demais ou se tornem habitues de algumas substâncias entorpecentes, com as quais se envolvem de maneira compulsiva.
Seus filhos possuem forte tendência para as artes, para a vida pública em geral e para a política profissional ou seja, para qualquer função onde exista predominância de contatos sociais intensos onde exista dinheiro em profusão e especialmente poder, mesmo que esse poder seja exercido de maneira democrática e aberta.
Até um dos defeitos mais comuns associados à superficialidade de Òsun é compreensível como manifestação mais profunda: seus filhos tendem a ser fofoqueiros, mas não pelo mero prazer d falar e contar os segredos dos outros, mas porque essa é a única maneira de terem informações em troca.
E informação é a matéria-prima de quem age nos bastidores, sutil e disfarçadamente como fazem os filhos de Òsun, amantes do sexo, do luxo, do prazer, mas que não se contentam só com isso.

 


O QUE DIZ A LENDA

Muitas são as lendas com a senhora da água doce. Envolveu-se com muitos òrisàs masculinos, sendo lembrada como amante de Ògún, a favorita das esposas de Sàngó e a mãe de Lògun-edè, nascido de sua relação com Òsóòsi. Sua ligação com a fecundada é explicita por esta narrativa nagô recolhida por J.E.dos Santos: Òsun seria a provedora de crianças. Ela deveria fazer com que elas permanecessem no ventre de suas mães, assegurando-lhes medicamentos e tratamento apropriado para evitar abortos e contratempos do nascimento mesmo depois de nascida a criança, até ela não estar dotada de razão e não estar falando alguma língua, o desenvolvimento e a obtenção de sua inteligência estariam sob o cuidado de Òsun.
Ao mesmo tempo, por sua beleza, Òsun teria despertado muitos amores. É, das mulheres, a que melhor se entende com Èsù, a quem devota especial amizade, tanto pelo gosto pelo prazer que ambos possuem como por esta narrativa:
Sàngó, muito inseguro e ciumento, e querendo exercer total controle sobre Òsun, achou que a esposa o traia e resolveu prende-la na torre de seu castelo. Èsù, passando por ali, ouviu Òsun chorando e quis saber a razão de seu sofrimento. A partir daí, levou o pedido de socorro a Orunmilá, o qual soprou um pó sobre Òsun, transformando-a numa pomba e possibilitando que ela voasse e fugisse do cativeiro. É por essa lenda que a pomba se tornou um animal sagrado e cujo consumo é proibido para os filhos de Òsun.